“João amava Teresa
que amava Raimundo
que amava Maria que
amava Joaquim que amava Lili
que não amava
ninguém.
João foi para os
Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de
desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e
Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado
na história.”
Carlos Drummond de
Andrade
Quando nascemos, nos aventuramos. Nascer é um
estúpido e inevitável risco que beira o constante. Sabemos do início, do meio,
mas do fim nada podemos prever. O desenrolar da nossa história se desenvolve
dentro de um labirinto. Às vezes não enxergamos a saída, e em uma curva ou em
outra, nos deparamos com coisas que mal podemos acreditar. O problema é que não
estaremos prontos nunca, nem para viver e muito menos para morrer. Estamos em
um eterno aprender.
Conheci Teresa, uma moça jovem, bonita, independente
e segura do que precisa e quer para o resto de toda sua vida, isso muito antes
dos trinta anos de idade. Muito antes dos muitos com seus quarenta e tantos
anos que não sabem aonde querem chegar.
Ela é daquele tipo doce ácido, indecifrável muitas
vezes. Teresa já sofreu com a possibilidade de ser amada, e embora triste,
Teresa parece quase sempre feliz. Bastam poucas coisas para colocar um sorriso
bem largo em seu rosto. ‘Por amores ela já chorou quem nem viúva, mas acabou’,
só não esqueceu!
Teresa um dia se viu perdida entre duas escolhas,
entre seguir e ficar. Entre um querer não querer. Ela queria, mas sua razão a
fazia recuar. “Arrisco mais uma vez ou fico assim como está?” Era muita pergunta
em meia frase para nenhuma resposta. É um estado agudo de indecisão. “Devo ir,
ou continuo assim de braços cruzados para o tempo que talvez passe, ou quem
sabe, chegue?” Teresa só encontra respostas que não servem mais. Viver era um
descuido que se repetia hora a hora. Teresa tinha medo, mas tinha esperança.
Era feliz, mas se sentia triste. Vivia cercada de bons amigos, mas era só.
Teresa que era de carne, mas fingia ser feita de
ferro já não sabia mais conjugar o verbo saudade, tão constante nessa vida
desconstruída, feita de fragmentos compostos de nós enlaçados com fitas soltas.
O tempo presente no passado fazia com que ela já não suportasse guardar o vazio
que é ter amado Raimundo. A saudade dela era meio clariciana, tal como fome,
que só passa depois que se come a presença. Mas Teresa não queria mais presença
nenhuma de Raimundo, nem do passado e nem do futuro. Ela sofre do mal da
lembrança que tem dificuldade para esquecer. Até apaga, mas não deleta.
Teresa anda pensando que Deus se esqueceu de por os
ósculos e não consegue enxergá-la aqui embaixo. Pobre Teresa... Tão confiante
em si, mas tão descrente da vida enquanto os outros.
A verdade é que ela não queria mais ser capaz. Só há
um coração cacto dentro dela. Está ferida e cansada como aquele bicho que foi à
luta, brigou como quem merece ganhar, mas não venceu. Ela vive se traindo com
suas memórias. Teresa está passando um filtro fino em sua vida e somente os
pedaços grandes vão ficando, como as tais lembranças inesquecíveis por serem
lembranças, que são alarme que dispara cada vez que João vai chegando. João que
ama Teresa que ama Raimundo que parece amar Maria, mas não ama ninguém. E assim
a vida de Teresa segue suspensa pelo fio da indiferença até que um sopro forte
a faça cair de pés no chão ou que a faça voar, mas enquanto isso, Teresa cuida
do que resta, pois é só o que resta fazer.
Texto:
*Leide Franco - Comunicadora com pretensões literárias;
Um pouco de filosofia e reflexões cotidianas;
Um muito de MPB
E quase nada do que ainda quero ser.
Escreve às segundas-feiras.
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